quarta-feira, 20 de maio de 2009

O lado esquerdo


O lado esquerdo. Do quarto. O lado onde pintavam os dedos de tinta colorida e depois empurravam a parede de rosa ou violeta ou laranja. A moça era tão sorriso. E a felicidade que devia mesmo dar como tinta no corpo. Sabe chorar de rir? Então. Uma lágrima verde, outra azul, outra cor de abóbora. Um roxo escorrendo pelos braços, por debaixo da camisa que pode até ser branca, tanto faz. Iam colorescendo juntos, soprando arco-íris como bolhas de sabão. E deixando as bolhas estourarem nos seus pés e rindo ao ver que os sapatos tinham ficado daquele jeito, felizes, como eles. O outro lado, não sei.

O lado esquerdo. Da cama. A moça era tão algodão. Nem lençol fazia vez de filho, nada no meio do casal. Uns contam bichos-travesseiro pra dormir, eles contavam qualquer coisa engraçada que lhes viesse à cabeça. 1, 2, 3, 15, 22, e eram muitas as coisas e até dormiam mais tarde por isso. Acordavam sábado no chão da sala, domingo na rede da varanda, terça no corredor, entre o quarto e o banheiro. A cama era somente o lugar que acomodava o sono. Só havia uma regra: que ela dormisse sempre do lado esquerdo dele. O outro, hoje não.

O lado esquerdo. Do corpo. A vida surgindo ali, nascendo. A moça era tão ai, era tão ela, era tão. E mais daquele lado. Tinha rompantes de desejos, queria nadar na casa, queria dançar no telhado, queria alimentar o cachorro do vizinho que ela conseguia enxergar da varanda, mas nunca sabia como chegar até ele. Sentia que era ali e somente daquele lado que os abraços aconteciam e o rostos ficavam vermelhos nas maçãs. Para eles, para ela, o coração era uma máquina de bombear felicidade e colorir pulmões, veias e tecidos. Tudo por causa do lado esquerdo. O outro, não importa.

            

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