sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Para Mia Couto

A mulher foi embora assim numa manhã, sem deixar nem vento. Ela era folha, ele era raiz. Ficou. E chorou porque homem que é homem se apresenta pra dor, mas não se demora muito nela. Ele a procurou na cidade e fora dela e não tinha uma árvore que não soubesse o rosto da mulher; colou a foto mesmo, que era pedido de ajuda. Um dia, o teto ficou longe e ele bateu a cabeça no chão. Era o primeiro enjôo. Nunca tinha sentido isso, mas não fugiu, se apresentou novamente e o médico pediu exame. O senhor não fuma, não bebe, não tem chefe, não tem porque cair assim. A minha barriga, doutor, ta fazendo o resto do corpo encolher. Desde quando? Faz tempo pequeno, foi quando ela foi embora, to assim de tanto esperar. O médico ficou branco quando deu a notícia: a espera é agora, tem um bebê na sua barriga. A cidade inteirinha querendo ver, que coisa assim se espalha logo e ele olhando a coragem e dizendo: vambora? E foram. Passou um mês, seis, nove e a mulher voltou. Voltou? Ele com dois corações batendo apressados e ela dizendo: não queria ter feito você esperar tanto. E ele: agora já foi. No dia seguinte, o bebê nasceu. Era a cara da mãe.

Um comentário:

  1. Belíssimas essas duas dedicatórias! Muitas vezes acredito que para inspirarmo-nos, basta ler os mestres :)

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